A democracia precisa prevalecer — Carta aberta das Reitoras e dos Reitores/Diretores eleitos e não empossados

A democracia é um valor que, para ser materializado, precisa ser praticado, e não apenas enunciado e debatido abstratamente. Não basta proclamar-se democrático. É preciso demonstrar, com ações, o respeito à vontade da Comunidade. E é justamente a falta desse respeito que vem sendo evidenciada, cada vez mais, pelas ações tanto do Ministério da Educação (MEC) quanto pelos colegas servidores que têm aceitado, contrariamente ao resultado das urnas, atuar como interventores ou como membros das equipes de intervenção nas Instituições Federais de Ensino que, desde 2019, tiveram negada a posse de suas reitoras e dos seus reitores/diretores eleitos.

Essa é a situação em que se encontram, nesta data, várias Instituições Federais de Ensino. Mesmo que seus futuros dirigentes tenham sido escolhidos em um ambiente verdadeiramente legítimo e democrático, essas Instituições sofrem as consequências amargas de procedimentos danosos de intervenção, enquanto buscam saídas por vias administrativas, políticas e até mesmo judiciais.

Do ponto de vista jurídico, os artigos 206 e 207 da Constituição Federal dispõem:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
(…)
II – Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o
pensamento, a arte e o saber;
III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência
de instituições públicas e privadas de ensino;
(…)
VI – Gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica,
administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao
princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

Nesse sentido, as garantias constitucionais definem a autonomia universitária como um dos pilares do Estado Democrático de Direito. Ao afrontá-la, as recentes nomeações e indicações feitas pela Presidência da República, por iniciativa antidemocrática do MEC, criam uma imagem institucional bastante negativa, corroborando para que a sociedade civil veja com descrédito as Instituições e seus processos decisórios, que devem ser sempre democráticos.

Até que ponto uma intervenção pode sufocar e até mesmo levar à morte esses espaços educacionais que eram reconhecidos, anteriormente, apenas pela qualidade da formação dos Estudantes, pela inovação de suas práticas e pela capacidade e formação de excelência de seus Corpos Docentes e Técnico-Administrativos? A pergunta é pertinente, pois o clima de medo, a ameaça de punições arbitrárias e o adoecimento físico e mental de suas Comunidades são apenas algumas das formas já percebidas de respostas individuais e coletivas ao sufocamento lento, invisível e inaudível imposto pela atitude governamental antidemocrática.

Realmente, para que serve um processo eleitoral de grandes proporções, envolvendo milhares de servidores e estudantes em dezenas de cidades, se o seu resultado não for integralmente respeitado? A prática da democracia seria apenas uma mera formalidade na visão de nossos representantes políticos?

A intervenção nas Instituições Federais de Ensino e a indicação de reitores biônicos remontam aos tempos da Ditadura Militar no Brasil e não são aceitáveis no Estado Democrático de Direito, conquistado a partir de duras lutas políticas e sociais e que tem na Constituição de 1988 seu grande marco.

Nessas Instituições, são realizadas, há mais de 30 anos, eleições para a escolha do Dirigente Máximo. Nesse tempo, a Rede Federal de Educação nunca sofreu ataques tão duros a sua democracia como ocorre agora por parte do atual Governo.

Diante desse quadro, os signatários têm consciência de que, tal como em outros momentos difíceis da nossa história, é só pela luta e organização coletiva que ele poderá ser revertido. Atualmente, temos nos mobilizado nesse sentido em muitas instâncias, com grande apoio do Movimento Estudantil, do Movimento Sindical e de organizações da sociedade civil que valorizam a democracia.

Portanto, é para ampliar e fortalecer esta luta pelo respeito às universidades e institutos federais que conclamamos a sociedade a se juntar a nós e exigir dos poderes constituídos que respeitem a democracia e a autonomia das instituições de ensino no país, obedecendo, portanto, as escolhas realizadas nelas, que devem ser acatadas na forma da lei e dos seus estatutos. Assim, consideramos relevante e histórico o entendimento do Excelentíssimo Senhor Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Edson Fachin, que, em manifestação oficial, declarou que as escolhas dos dirigentes máximos das universidades e institutos federais devem seguir os seguintes requisitos: “(I) se ater aos nomes que figurem na respectiva lista tríplice; (II) respeitar integralmente o procedimento e a forma da organização da lista pela instituição universitária; e (III) recaia sobre o docente indicado em primeiro lugar na lista.”

Ocorre que acima de tudo e de todos está a Constituição de 1988. Ainda, conforme declara o Ministro Fachin em seu voto sobre a ADI 6565, “a nomeação de Reitores e Vice-Reitores não pode ser interpretada como dispositivo para o desenvolvimento de agendas políticas, ou como mecanismo de fiscalização” (…) “A nomeação não é instrumento de gestão porque não deve ser veículo de ingerência”. Nessa esteira, as eleições realizadas pelas Comunidades Acadêmicas vão ao encontro e são coerentes com o princípio democrático e com a autonomia universitária consagrados na Constituição de 1988. Por isso, nos juntamos a muitas vozes do passado e do presente para reafirmar: reitoras e reitores/diretores eleitos devem ser reitoras e reitores/diretores empossados!

Temos força para continuar e pedimos que cada vez mais pessoas e entidades juntem-se a nós, nessa batalha contra o autoritarismo, dentro e fora de nossas Instituições. Afinal, a democracia precisa prevalecer!

Brasil, janeiro de 2021.

Reitoras e reitores/ diretores eleitos

Anderson André Genro Alves Ribeiro
Reitor Eleito
Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)

André Macêdo Santana
Reitor Eleito
Universidade Federal do Piauí (UFPI)

Etienne Biasotto
Reitor Eleito
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Lísia Regina Ferreira
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)

Carlos Sait Pereira de Andrade
Vice Reitor Eleito
Universidade Federal do Piauí (UFPI)

Cláudia Gonçalves de Lima
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Ethel Leonor Noia Maciel
Reitora Eleita
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Fabio César da Fonseca
Reitor Eleito
Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)

Georgina Gonçalves dos Santos
Reitora Eleita
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)

Gilciano Saraiva Nogueira
Reitor Eleito
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM)

Patrícia Maria Vieira
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)

José Pereira Mascarenhas Bisneto
Vice Reitor Eleito
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)

Carlos Henrique Alexandrino
Reitor Eleito
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM)

José Arnóbio de Araújo Filho
Reitor Eleito
Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN)

Leonardo Villela de Castro
Reitor Eleito
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)

Maria do Carmo Ferreira
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)

Maurício Gariba Júnior
Reitor Eleito
Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC)

Maurício Saldanha Motta
Diretor Geral Eleito
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ)

Maurilio de Abreu Monteiro
Reitor Eleito
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA)

Rodrigo Nogueira de Codes
Reitor Eleito
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA)

Rui Vicente Oppermann
Reitor Eleito
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Telio Nobre Leite
Reitor Eleito
Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)

Terezinha Domiciano Dantas Martins
Reitora Eleita
Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

Francisco Edcarlos Alves Leite
Vice Reitor Eleito
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA)

Jane Fraga Tutikian
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Lucia Marisy Souza de Oliveira
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)

Monica Nóbrega
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

Custódio Almeida
Reitor Eleito
Instituto Federal do Ceará (UFC)

Marcel Fernanda da Costa Parentoni
Reitor Eleito
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)

Paulo Roberto Ferreira Júnior
Reitor Eleito
Universidade Federal de Pelotas (UFPel)

Rodrigo Silva Lima
Vice Reitor Eleito
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)

Ursula Rosa da Silva
Vice Reitora Eleita
Universidade Federal de Pelotas (UFPel)

Adilson Jesus Aparecido de Oliveira
Reitor Eleito
Instituto Federal de São Carlos (UFSCar)